Thursday, November 01, 2007

Soneto de amor


Não me peças palavras, nem baladas,
Nem expressões, nem alma ... Abre-me o seio,
Deixa cair as pálpebras pesadas,
E entre os seios me apertes sem receio.

Na tua boca sob a minha, ao meio,
Nossas línguas se busquem, desvairadas ...
E que os meus flancos nus vibrem no enleio
Das tuas pernas ágeis e delgadas.

E em duas bocas uma língua ..., - unidos,
Nós trocaremos beijos e gemidos,
Sentindo o nosso sangue misturar-se.

Depois... - abre os teus olhos, minha amada!
Enterra-os bem nos meus; não digas nada ...
Deixa a Vida exprimir-se sem disfarce!

(José Régio, "Soneto de amor", in "eros de passagem", Poesia Erótica Contemporânea, Selecção e Prefácio de Eugénio de Andrade, Desenhos de José Rodrigues, Editora LIMIAR, Dezembro 1982)

José Régio


José Régio, pseudónimo de José Maria dos Reis Pereira, era natural de Vila do Conde. Aos 18 anos, foi para Coimbra, onde se licenciou em Filologia Românica (1925), com a tese «As Correntes e As Individualidades na Moderna Poesia Portuguesa», pouco apreciada, sobretudo pela valorização que nela fazia de dois poetas então quase desconhecidos, Mário de Sá-Carneiro e Fernando Pessoa.

Foi um dos fundadores em 1927 da revista Presença, que marcou o segundo modernismo português, de que foi o principal impulsionador e ideólogo.

No mesmo ano iniciou a sua vida profissional como professor de liceu, primeiro no Porto (apenas alguns meses) e, a partir de 1928, em Portalegre, onde permaneceu mais de trinta anos. Só em 1967 regressou a Vila do Conde, onde morreu dois anos mais tarde.


Centrais, na sua obra, são as problemáticas do conflito entre Deus e o Homem, o indivíduo e a sociedade, numa análise crítica das relações humanas e da solidão.

4 comments:

Paula Raposo said...

Um soneto para o qual fico sem palavras...

Maria, Flor de Lotus said...

Gosto especialmente de José Régio.
Da intensidade da sua poesia que nem todos sabem compreender e sentir.
Que mulher afortunada teria sido brindada pelo poeta com palavras de tão grande genialidade e beleza ?
Sendo certo que o poeta é sempre um "fingidor", como diria Pessoa, qualquer uma poderá adequar-se ao perfil.
Parabéns, pelo seu blog. è muito interessante e está muito bem construído.
Descobriu-o enquanto agradavelmente saboreava a minha chávena de café.
Felicidades.

Unknown said...

De cortar a respiração!

Abraço.

LUIS MILHANO (Lumife) said...

Poema forte. Uma realidade bem transmitida nas palavras de José Régio.

Já regressei de Alvito. Sabe sempre bem ir até ao Alentejo respirar aqueles ares.

Um abraço