Thursday, November 02, 2006

Leões de Azul



(Neste impossível tom gramatical,
o tempo agora:
um verso conclusivo e inclusivo
que nos cantasse todos, mesmo os que
nem assim, e ainda assim,
de uma matéria mesma e de uma angústia
feita
tão de ninho.)

O teu corpo na cama junto ao meu,
em agasalho incerto,
a minha mão em torno do avesso
daquilo que mais posso.
O osso do poema assim pasmado,
mas de um som tão inverso
que atrairia lendas e
canções.

O tempo agora é este:
o de fazer tão rentes as canções,
também aproveitar as velhas trovas
e resgatar leões do fundo mais profundo
do palácio, do coliseu,
do circo.

Um rugir de leão
que nos cantasse igual:
habitantes de um mundo em utopia
incerta e tão azul de borboleta
(que a flor às vezes falha e a caneta:
sem tinta, e a canção: sem amparo
nem profeta).

Mas o teu corpo assim adormecido,
às quase quatro horas da manhã,
lembrou-me destas coisas,
e fez-me acreditar nalguns palácios,
em pequenos rugidos do acaso,
na força da palavra.

E que moramos todos por igual:
azul redondo,
anti-gramatical e tão incerto
como a pele de outros mundos:
a dos leões, por exemplo, macia,
ou a tua, tão longa, hirsuta, estranha,
como a de um mundo outro.
Ou tão igual que a minha.

(Neste impossível tom gramatical,
manter o espanto do que não tem
nome. Mas habita este espaço e
este tempo e é neles: coisa
inteira.)

(Ana Luísa Amaral)

Quadro de Heny Rousseau: “La Bohémienne endormie”

8 comments:

Maria Carvalho said...

Adorei este poema!! Lindo! Beijos para ti e mais uma vez obrigada pelas palavras sempre queridas que me deixas nas romãs...

Papoila said...

Grata pelo comentário deixado no campo. Este poema é lindíssimo! O quadro de Heny Rousseau: “La Bohémienne endormie” perfeito para o ilustra.
Beijo

Heloisa B.P said...

"O osso do poema assim pasmado,
mas de um som tão inverso
que atrairia lendas e
canções.

O tempo agora é este:
o de fazer tão rentes as canções,
também aproveitar as velhas trovas
e resgatar leões do fundo mais profundo
do palácio, do coliseu,
do circo.

Um rugir de leão
que nos cantasse igual:
habitantes de um mundo em utopia
incerta e tão azul de borboleta
(que a flor às vezes falha e a caneta:
sem tinta, e a canção: sem amparo
nem profeta).

Mas o teu corpo assim adormecido,
às quase quatro horas da manhã,
lembrou-me destas coisas,
e fez-me acreditar nalguns palácios,
em pequenos rugidos do acaso,
na força da palavra.

E que moramos todos por igual:
azul redondo,
anti-gramatical e tão incerto
como a pele de outros mundos:
a dos leões, por exemplo, macia,
ou a tua, tão longa, hirsuta, estranha,
como a de um mundo outro.
Ou tão igual que a minha.

(Neste impossível tom gramatical,
manter o espanto do que não tem
nome. Mas habita este espaço e
este tempo e é neles: coisa
inteira.)"
*******************SIMPLESMENTE, SOBERBO!!!!!
e... a *PINTURA* que O encima... IGUAL AO GOSTO SUBLIME DO *PETER* E...EM EXCELENTE "PARCERIA" COM O *POEMA*!!!!
_ADOREI!
****************Fica meu Abraco, meu CARISSIMO AMIGO*!
Heloisa
**************

Klatuu o embuçado said...

Bela (dupla) escolha.

Amita said...

Uma tela perfeita para ilustrar um belíssimo poema.
Um bjo

Anonymous said...

Poema lindissimo.
Adorei mesmo.
Beijito.

L said...

eu também acho que os leões se deviam fazer sócios e passar para uns tons mais azuis... e brancos :-)

APC said...

QUE LINDO, QUE LINDO, QUE LINDO!
Amei o poema, adorei o quadro, apreciei a mistura. Ficou-me!
Um abraço.