Sunday, December 03, 2006

Natal



Acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.
Era gente a correr pela música acima.
Uma onda uma festa. Palavras a saltar.

Eram carpas ou mãos. Um soluço uma rima.
Guitarras, guitarras. Ou talvez mar.
E acontecia. No vento. Na chuva. Acontecia.

Na tua boca. No teu rosto. No teu corpo acontecia.
No teu ritmo nos teus ritos.
No teu sono nos teus gestos.
Nos teus gritos. Nos teus olhos quase aflitos.
E nos silêncios infindos. Na tua noite e no teu dia.
No teu sol acontecia.

Era um sopro. Era um salmo. Nostalgia; nostalgia.
Todo o tempo num só tempo: andamento
de poesia. Era um susto. Ou sobressalto. E acontecia.
Na cidade lavada pela chuva. Em cada curva
acontecia. E em cada acaso. Como um pouco de água turva

na cidade agitada pelo vento.

Natal, natal diziam. E acontecia.
Como se fosse na palavra a rosa brava
acontecia. E era Dezembro que floria.
Era um vulcão. E no teu corpo a flor e a lava.
E era na lava a rosa e a palavra.
Todo o tempo num só tempo: nascimento de poesia.

( Manuel Alegre )

Pintura de Amedeo Modigliani, (1884-1920) “Nu reclinado”

9 comments:

LUIS MILHANO (Lumife) said...

"Natal, natal diziam. E acontecia.
Como se fosse na palavra a rosa brava
acontecia. E era Dezembro que floria.
Era um vulcão. E no teu corpo a flor e a lava.
E era na lava a rosa e a palavra.
Todo o tempo num só tempo: nascimento de poesia."
Manuel Alegre e um estilo muito próprio.

Acertaste na origem da naturalidade da Olinda Bonito...

O seu blog http://maisvidas.blogspot.com já aí está na net.

Um abraço

Diabba said...

Sabes o que me cativou? A paz da musica...

Confesso k não sou dada a poesias... fico de chifres no ar qdo vou a um blog e me deparo só com poesia... a vida não é só isso... não comento... fujo!

Não fugi, li e ouvi a musica toda!

Beijo de enxofre

BlueShell said...

"era um sopro"....

Lindas as tuas escolhas...

Lindas as palavras com que me brindas quando me visitas....
Obrigada!
BShell

Maria Carvalho said...

É belíssimo este poema do Manuel Alegre. Gostei de o ter lido, hoje, aqui. Beijos.

Papoila said...

"Natal, natal diziam...
Era um vulcão. E no teu corpo a flor e a lava.
E era na lava a rosa e a palavra.
Todo o tempo num só tempo: nascimento de poesia."

Um poema fantástico de Manuel Alegre.
Beijo

Amita said...

Uma belíssima escolha.
"era Natal diziam" como no poema as palavras corriam...
Um bjinho

Menina Marota said...

Um dos meus preferidos de Manuel Alegre!

Sabes que já o tenho preparado para o postar num outro blog meu?

Coincidências de gostos...

Adoro mesmo este poema!!

Beijinho e tem um bom dia ;)

Olinda Bonito said...

gosto deste poema do Manuel Alegre como de quase todos,mas acho.o um bocado «pesado »para a época, embora eu saiba que há Natais muito mais ...não me apetece dizer mais.
QUE HAJA NATAL.

Nilson Barcelli said...

Sabe sempre bem ler ou reler o Manuel Alegre.
Ainda que neste poema de Natal pouco convencional...
Boa semana.
Um abraço.