Wednesday, June 01, 2005

O canto nocturno

Eram ardentes grãos num mundo dilatado
e as copas balouçavam numa vagarosa calma.
O deus da noite absorvera os gritos e os apelos
e só se ouvia o marejar de uma matéria vaga.
E era já um canto, o sonho violento que desperta
entre troncos de árvores, entre estrelas
e entre as figuras de pedra de um jardim.
”Será que tudo se liga, o deserto e o oásis,
a mão de terra e o rio que brilha,
os projectos que formamos e a ondulada calma?”*
Ele abraça o sono de uma deusa que é ausência
ardente e verde nos seus flancos de terra,
mas noutra vertente a água é penetrada
pela luz que ascende por escadas cristalinas.
Os instrumentos nupciais nas mãos mediadoras
são cachos de pedras e guitarras de argila.
Sob uma vaga imóvel todos ramos do sangue
se acendem no ovo verde da folhagem.

(António Ramos Rosa, “Acordes”)

*Como ARR aqui traduz as dúvidas com que me debato e às quais,
desajeitadamente vou dando vazão ...

2 comments:

Anonymous said...

Olá. Vim matar saudades, ler as novidades e desejar um bom fim de semana*

Deixo um beijo com carinho*

Anonymous said...

Dúvidas que nos envolvem a todos...afinal...
Tudo tem seu significado muito própio, sua razão de ser...
Tudo se liga....de algum modo....
Beijo, BShell